domingo, 20 de setembro de 2015

O que faz você feliz?

Documentário Happy



Raquel Rocha
Economista, Comunicóloga, Psicanalista e Especialista em Saúde Mental
Membro da Academia de Letras de Itabuna



Qual o segredo da felicidade? Quais fatores podem desencadear esse sentimento? Como alcançá-la? Como permanecer no estado de felicidade? Isto é possível? Essas e outras perguntas estão presentes no documentário Happy de 2011. Dirigido por Roko Belic (Genghis Blues, The Batmobile).

Belic decidiu-se fazer o filme por inspiração do seu amigo, o também diretor Tom Shadyac (Ace Ventura, O Professor Aloprado. O Mentiroso, Patch Adams, O Mistério da Libélula, Todo Poderoso, A Volta do Todo Poderoso). Happy levou 6 anos para ser concluído e foi gravado em 14 países diferentes. Entre eles Índia, Dinamarca, Namíbia, Quênia, Escócia, China, Japão, Butão, Estados Unidos e Brasil.

O documentário começa com o morador de uma favela na Índia. Ele transporta pessoas puxando-as a pé no riquixá (uma espécie de carroça). E é esse condutor riquixá quem descreve a dificuldade de seu próprio trabalho: “Alguns passageiros abusam de nós, especialmente os bêbados. Mas eu nunca brigo (...). No verão, meus pés e cabeça queimam no calor do sol. Chega a doer”

Esse depoimento é o ponto de partida para que Belic pudesse apresentar um estudo recente, que demonstra que aquele condutor é tão feliz quanto um americano médio. E em seguida o mesmo motorista de riquixá fala do quanto gosta do barraco no qual mora com sua família. Além do fato de que é bom voltar para casa e ser recebido por seus filhos: “Ao ver o rosto do meu filho, me sinto muito feliz. Sinto que não sou pobre, sinto que sou a pessoa mais rica.”

A felicidade pode melhorar tudo em nossas vidas, ao sermos felizes, temos melhores relacionamentos, melhor desempenho no trabalho, melhor saúde.  Mas o que influencia o grau de felicidade? O documentário explica-nos que 50 % desse grau de felicidade é determinada pelos genes; 10% pelas circunstâncias, emprego, dinheiro, status social, saúde. E 40% pela atividade intencional, isto é, aquilo que você decide fazer te deixa feliz.

Os estudos sobre a felicidade pesquisam a dopamina, um neurotransmissor responsável pelas sensações de prazer. “Conforme a pessoa fica mais velha, a partir da adolescência ela perde sinapses de dopamina e provavelmente neurônios de dopamina [...] Se a perda for severa, a pessoa fica com mal de Parkison”. A ideia, portanto, é buscar experiências que liberem dopamina ou exijam dopamina. Atividades físicas estão entre as melhores opções. Sempre mudando o jeito de fazer.  A mudança é importante. “A variedade é o tempero da vida.”

Mas será que as adversidades tornam as pessoas infelizes? O documentário Happy diz que nem sempre. O importante é a capacidade de resiliência. Na verdade, não existe prazer sem dor, pois o sistema nervoso é um motor diferencial. Ele procura diferenças, contrastes e faz comparações. Um pedaço de pão pode deixar um faminto muito feliz, mas, em linhas gerais, não deixaria alguém que tem sempre comida a sua disposição.

E quanto àquele velho ditado? Dinheiro traz ou não traz felicidade? Bem, o dinheiro pode alterar seu grau de felicidade até o momento em que ele supre suas necessidades básicas. A partir daí, o dinheiro não compra sua felicidade, porque não importa o seu grau de riqueza, você vai se adaptar a ele e desejar sempre mais: “A adaptação hedonista é um dos maiores inimigos da felicidade.” Se, por um lado, o dinheiro pode não fazer assim tanta diferença, há um fator que influência muito: as relações humanas. Deste modo, foi identificado que os indivíduos felizes sempre têm família e amigos próximos.

As pessoas em geral possuem na vida dois tipos de metas: Intrínsecas e Extrínsecas. As extrínsecas focam, obviamente, algo externo às pessoas: recompensas, elogios, dinheiro, boa aparência, sucesso financeiro. As metas intrínsecas estão relacionadas às necessidades psicológicas do indivíduo: crescimento pessoal, ser você mesmo, ter relacionamentos próximos com amigos e familiares, sensação de comunidade, vontade de ajudar o mundo a ser um lugar melhor.

Uma década de estudo mostrou que as pessoas mais orientadas pelas metas extrínsecas, voltadas ao dinheiro, status e imagem, por exemplo, declararam maior insatisfação com a vida. Essas pessoas eram mais deprimidas e mais ansiosas, tinham menos energia no dia a dia. As pessoas orientadas a metas intrínsecas (crescimento pessoal, ser você mesmo, ter relacionamentos próximos com amigos e familiares, por exemplo) eram mais felizes, tinham mais vitalidade, menos depressão, menos ansiedade.

E existe diferença de felicidade de um lugar para outro? Os estudos mostram que o Japão é o país menos feliz entre os países industrializados. Uma sociedade que vive voltada para o estudo e o trabalho. Isso teria sido necessário para propiciar a reconstrução do país no pós-guerra. Hoje, um fenômeno novo é identificado por lá: as pessoas estão morrendo de tanto trabalhar; já existe até uma palavra para isso – “karoshi”.

Outros países colocam a felicidade entre suas prioridades. O Butão (país localizado na Ásia, na Cordilheira do Himalaia, entre a China (ao norte) e a Índia (ao sul)), por exemplo, usa como parâmetro de crescimento, em vez do PIB, a FIB, Felicidade Interna Bruta.

A Dinamarca também aparece no ranking dos mais felizes. Um país conhecido pela igualdade social e alto padrão de vida. Lá todos recebem educação e saúde gratuitas. Muitas pessoas daquele país moram em comunidades de coabitação, que são locais onde várias famílias convivem juntas, cooperam umas com as outras em diversas atividades e se ajudam no que precisa. Uma experiência que reforça a importância das relações humanas.

Ter religião ou sentimentos espirituais também é benéfico, porque isso conecta as pessoas entre si e as conecta ao universo, algo maior que elas. No entanto, esse princípio não se aplica às religiões radicais, que alimentam o ódio, utilizando-se de ideias fundamentalistas.

Numa sociedade que estimula a competição, os estudos mostram que o ser humano é programado para se sentir bem quando ajuda o outro, pois cooperação gera sinais de dopamina. E o documentário Happy mostra que quando ajudamos, mudamos o foco de “O que eu não tenho” para “O que eu tenho para dar”. Em Happy, a sabedoria de diversas culturas é apresentada, junto com o resultado de estudos e opiniões de especialistas.

O documentário Happy tem duração de 75 minutos e faz você refletir sobre a sua própria felicidade. O que você faz é por você mesmo ou só pelas aparências? Quanta importância você dá às conquistas matérias? Você pratica gratidão, compaixão, carinho, amor, altruísmo?

Happy faz você se questionar sobre o que realmente importa na vida e acima de tudo mostra que a felicidade não pode ser atingida sozinha. Ou como bem cantou Tom Jobim (“Wave”): “Vou te contar / Os olhos já não podem ver / Coisas que só o coração pode entender / Fundamental é mesmo o amor / É impossível ser feliz sozinho”.

Enfim, amar e ser amado, apoiar e ser apoiado, cuidar e ser cuidado, eis o que faz da vida uma experiência prazerosa e gratificante.

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