terça-feira, 30 de agosto de 2011

"... Assim tudo acaba em silêncio e poesia."


"Passo agora a responder à sua pergunta sobre a gênese dos meus heterônimos. Vou ver se consigo responder-lhe completamente. Começo pela parte psiquiátrica. A origem dos meus heterônimos é o fundo traço de histeria que existe em mim. Não sei se sou simplesmente histérico, se sou, mais propriamente, um histero-neurastênico. Tendo para esta segunda hipótese, porque há em mim fenômenos da abulia que a histeria, propriamente dita, não enquadra no registro de seus sintomas. Seja como for, a origem mental dos meus heterônimos está na minha tendência orgânica e constante para a despersonalização e para a simulação. Estes fenômenos- felizmente para mim e para os outros- mentalizaram-se em mim; quero dizer, não se manifestam na minha vida prática, exterior e de contato com os outros; fazem explosão para dentro e vivo-os eu a sós comigo. Se eu fosse mulher- na mulher os fenômenos histéricos rompem em ataques e coisas parecidas- cada poema de Álvaro de Campos( o mais histericamente histérico de mim ) seria um alarme para a vizinhança. Mas sou homem- e nos homens a histeria assume principalmente aspectos mentais; assim tudo acaba em silêncio e poesia..."

(Fernando Pessoa)

Um comentário: