Raquel Rocha
Economista, Comunicóloga, Psicanalista e Especialista em Saúde Mental
Membro da Academia de Letras de Itabuna
Os nomes
são muitos, Transtornos de Conduta Antissocial, Desordem de Personalidade
Dissocial, Personalidade Sociopática, Psicopatia, Sociopatia. No CID 10
(Classificação Internacional das Doenças) encontramos o código F60.2 e a
nomenclatura Transtorno de Personalidade dissocial. No DSM-IV (Diagnostic and
Statistical Manual of Mental Disorders) o código é 301.7 e o nome de Desordem de Personalidade Antissocial.
“Com base nos
critérios descritivos da psicopatia da obra de Cleckley (1941/1976), a American
Psychiatric Association apresentou a categoria chamada Distúrbio da
Personalidade Sociopática na primeira versão do DSM (Vaugh & Howard,
2005). O termo sociopatia, em sua acepção mais intuitiva, caracteriza um padrão
recorrente de comportamentos socialmente desviantes. Não implica
necessariamente psicopatia, que é um construto mais complexo e envolve aspectos
interpessoais e afetivos, além do comportamento anti-social. Contudo, a
utilização do termo sociopata, àquela época, mostra uma tentativa por parte da
comunidade científica em atentar para os determinantes sociais da psicopatia
(Vaugh & Howard, 2005). Essa mesma nomenclatura, Distúrbio da
Personalidade Sociopática, apareceu na segunda edição do DSM e então, na
terceira edição, foi substituída pelo termo Transtorno da Personalidade
Anti-Social (Arrigo & Shipley, 2001), que se mantém até hoje no
DSM-IV-TR (APA, 2002)”
(Nelson
Hauck Filho, Marco Antônio Pereira Teixeira, Ana Cristina Garcia Dias: Psicopatia: o construto e sua avaliação.
Aval. psicol. v.8 n.3 Porto Alegre dez. 2009, grifo nosso)
Alguns
autores classificam o Transtorno de Personalidade Antissocial (TPAS) como sendo
a mesma coisa que psicopatia e sociopatia. Alguns manuais evitam o termo
Psicopatia, para evitar a confusão e há ainda os que classificam a Psicopatia
dentro do TPAS, mas atribuído a casos extremos.
“Como visto
anteriormente, a psicopatia não deve ser confundida com o TPAS. De fato, a
psicopatia só se caracteriza em uma parcela dos casos de TPAS.(...) Então qual
seria a vantagem de se investigar a psicopatia e utilizar esse termo? A
resposta pode ser encontrada na própria história do construto: o termo surgiu
para designar quadros de comportamentos anti-sociais extremados,
usualmente associados a crimes violentos e bárbaros, em que as faculdades da
razão não pareciam prejudicadas.” (Nelson Hauck FilhoI,; Marco Antônio Pereira
TeixeiraI, ; Ana Cristina Garcia Dias,
Psicopatia: o construto e sua avaliação. Aval. psicol. v.8 n.3 Porto
Alegre dez. 2009, grifo nosso)
“Existem outros transtornos, com características
bastante semelhantes aos da psicopatia, que também são conhecidos, tais como o
transtorno de personalidade antissocial (TPAS) e a sociopatia. Embora
compartilhem da maioria dos sintomas, a psicopatia apresenta, segundo Hare
(1991), características que não estão presentes nos antissociais e sociopatas. Em
contrapartida, a APA (2002) classifica o transtorno de personalidade
antissocial como sendo igual à psicopatia e a sociopatia. Deste modo, o
TPAS, a psicopatia e a sociopatia não são categorias distintas, mas sim
categorias sobrepostas e complementares (SHINE, 2000). Portanto, é possível
inferir que todos os psicopatas devem ser considerados antissociais e
sociopatas, mas destes nem todos podem ser considerados psicopatas (BLAIR,
2003; MORANA, 2004)
(Psicopatia em homens e mulheres, Cema Cardona
Gomes e Rosa Maria Martins de Almeida, grifo nosso)
No CID
10, no agrupamento de Transtornos das personalidades, a Personalidade Dissocial
(F60.2) vem subdividida em: Amoral, anti-social, associal, psicopática e
sociopática (Plataforma Datasus, Ministério da Saúde). O diagnóstico exclui
transtorno de conduta (F91.) e Personalidade do tipo instabilidade emocional
(F60.3)
Diante de
tantas nomenclaturas e conceitos, vamos nos ater a abordagem que caracteriza a
Psicopatia como uma das formas do Transtorno de Personalidade Antissocial
(TPAS), sendo a Psicopatia a forma mais grave. Portando neste texto será
utilizado as nomenclaturas Psicopatia e TPAS.
O TPAS,
(e por conseguinte a Psicopatia) é uma desordem de personalidade caracterizada
pelo desprezo as regras sociais, frieza e ausência de empatia. A falta de
emoções e ausência de culpa são as principais características do psicopata. O
portador da Personalidade Antissocial, devido a sua incapacidade de se colocar
no lugar do outro e sentir a dor do outro, pode vir a cometer crimes com fortes
traços de crueldade, esses são os chamados Psicopatas.
O
Psicopata é um indivíduo amoral que vive segundo suas próprias regras. Ele vê
as pessoas como coisas, e como tais podem usadas segundo seus interesses. Não
possuem emoções por isso são extremamente racionais, chegando a apresentar uma
inteligência acima da média. São eloquentes, conseguem convencer os outros do
que querem. Não sentem emoções mas aprende a imitá-las muito bem por isso são
excelentes atores e gostam de se fazer de vítimas. São narcisistas,
egocêntricos e egoístas, tem baixa tolerância a frustrações e uma tendência a
irritabilidade e agressividade, mas conseguem esconder bem suas
características, podendo aparentar uma pessoa muito calma.
Como não
há sentimento, também não há o apego. Eles se entediam muito rápido e precisam
se sentir estimulados constantemente. Não ficam muito tempo em um emprego e possuem
uma tendência a serem parasitas, explorando os outros para viver. Suas relações
conjugais são curtas e numerosas e eles não estabelecem metas a longo prazo.
Também se identifica no TPAS uma conduta sexual promiscua.
Possuem
uma atitude de dominância e autoestima elevada, se acham superiores às outras
pessoas porque não tem as mesmas “fraquezas” (emoções) que “limitam” as pessoas
normais. Não sentem vergonha nem medo de desaprovação, o outro não tem
importância para ele (a não ser como um objeto) e eles são capazes de ficar
longos períodos sozinhos.
As causas
da Psicopatia são controversas entre os estudiosos. Há correntes que defendem
que ela é causada por uma predisposição genética, outros alegam uma disfunção
na biologia do cérebro (no lobo frontal e no Sistema Límbico). E alguns
argumentam o meio social, mas especificamente traumas psicológicos sofridos na
infância (abusos, negligência, violência física e emocional).
Ao que
tudo indica o transtorno junção de dois ou mais fatores. Se predisposição genética por si só desencadearia
o transtorno é algo muito debatido. Del-Bem (2005) discorre sobre as possíveis causas:
“Sabe-se pouco a respeito das causas do TPAS, mas
seria ingenuidade negligenciar a influência de fatores psicossociais no
desenvolvimento de comportamento anti-social. A ocorrência de eventos
estressores nos primeiros anos de vida, como conflitos entre os pais, abuso
físico ou sexual e institucionalização, tem sido associada ao TPAS (O’Connell,
1998; Cadoret, 1991). Em uma revisão a respeito dos fatores de risco para o
desenvolvimento de transtorno de conduta ou de personalidade anti-social, Homes
et al. (2001) concluem que nenhum fator isolado pode ser identificado como
agente causal de TPAS, mas alguns específicos, quando combinados, poderiam
predispor ao desenvolvimento de comportamento anti-social na vida adulta.”
(Cristina Marta Del-Bem, Neurobiologia do transtorno de personalidade
anti-social)
A
biologia do cérebro também pode desencadear o transtorno. O Sistema límbico,
por exemplo, é responsável pelas emoções, sentimentos e comportamento sociais,
é onde se desenvolvem as funções afetivas, sensações de culpa e prazer. O amor,
a raiva, o medo, alegrias e tristezas são sentimentos originados no sistema
límbico. Já ao lobo frontal cabe, entre outras, a função de raciocínio e
comportamentos voltados para o convívio social, prevenção das consequências das
condutas adotadas além da utilização de padrões éticos e morais. O
comportamento, adotado pelo lobo frontal decorre da informação recebida no
sistema límbico, por isso um dano em uma dessas áreas, levaria o indivíduo a um
comportamento desprovido de emoções culpa.
“Os estudos de neuroimagem estrutural com
ressonância nuclear magnética apontam alterações volumétricas do lobo
frontal no TPAS. Comparando pacientes com diagnóstico de TPAS com controles
não clínicos, pacientes com dependência de substâncias psicoativas e pacientes
com outros diagnósticos psiquiátricos, Raine et al. (2000) verificaram que os
pacientes com TPAS apresentavam uma redução do volume da matéria cinzenta
pré-frontal e que esta redução correlacionavase com uma diminuição da resposta
autonômica a um evento estressor provocado experimentalmente – no caso, a
realização de um discurso.” (Cristina Marta Del-Bem, Neurobiologia do
transtorno de personalidade anti-social. Grifo nosso)
“A amígdala é outra estrutura que estudos
volumétricos tem implicado na fisiopatogenia do TPAS. Tiihonen et al. (2001) verificaram
que o volume da amígdala correlacionou-se negativamente com os escores do PCL-R
em criminosos violentos. Também foi descrita uma associação entre escores
elevados no PCL-R e reduções bilaterais do volume de hipocampo posterior em
criminosos violentos (Laasko et al., 2001). Esses últimos resultados devem ser
tomados com cuidado, por se tratarem de amostra pequena, com comorbidade com
dependência ao álcool e sem grupo-controle.”
(Cristina Marta Del-Bem, Neurobiologia do transtorno de personalidade
anti-social)
O meio
social também parece ter grande interferência, embora não sabemos se ele
funcional como fator causal, desencadeador ou agravante.
“O que se observa, de fato, é que poucos estudos
se dispuseram a explorar de maneira sistemática a correlação entre
eventos/experiências de vida e personalidade anti-social, provavelmente devido
à complexidade inerente ao delineamento de projetos capazes de controlar alguns
vieses metodológicos. Um bom exemplo dessas limitações seria a associação de
maus tratos na infância com o desenvolvimento de TPAS na vida adulta. Esta
associação poderia, na verdade, confundir uma associação genética, já que a
instituição de maus tratos a filhos é uma das características clínicas que
podem estar presentes no TPAS. Por outro lado, TPAS também ocorre em pessoas
sem história de conflitos familiares ou estressores significativos na infância
e há evidência de predisposição genética (McGuffin e Thapar, 1992). A
hereditariedade parece contribuir em grau substancial para o desenvolvimento de
comportamento anti-social. Em uma metanálise de estudos com gêmeos e crianças
adotadas, Mason e Frick (1994) verificaram que 50% da variância encontrada nas
medidas de comportamento anti-social poderiam ser atribuídas a fatores
genéticos.” (Cristina Marta Del-Bem, Neurobiologia do transtorno de
personalidade anti-social)
A
Associação Americana de Psiquiatria (APA) define que o menor de 18 anos não deve
ser classificado como psicopata, já que sua personalidade ainda não está
plenamente formada. No entanto, os considerados Psicopatas na fase adulta
manifestam o transtorno geralmente na infância. São crianças que mentem,
dissimulam, maltratam animais e outras crianças, não respeitam autoridades,
manipulam para conseguir o que querem. Há ainda uma tendência a piromania, que
se constitui no prazer em atear fogo à coisas (também animais) e a provocar
incêndios.
Na
adolescência cometem atos de delinquência, testando seus limites. Quando
adultos podem ou não vir a se tornarem criminosos. Embora os psicopatas assassinos
sejam bastante conhecidos, a grande maioria dos portadores do distúrbio não
chegam a matar. Todos no entanto mentem e manipulam para conseguir o que
querem.
São
conscientes dos códigos de condutas sociais por isso não respondem penalmente
pelos seus crimes. A desordem de personalidade pode se apresentar em diferentes
níveis, o leve, o moderado e o grave, como os serial killers.
A
Psicanálise considera 3 tipos de estruturas psíquicas: Neurose (fobias,
ansiedade, obsessão, etc), Psicose (esquizofrenia, paranoia) e Perversão. Os
psicopatas se enquadram na terceira categoria.
A
psicopatia não tem cura. Não existe nenhum tratamento totalmente eficaz, nem
psíquico nem farmacológico. Estima-se que 25% da população carcerária seja de
psicopatas, ou seja, são presos irrecuperáveis para a medicina até a
atualidade. Não há muito o que fazer em relação a psicopatia, como eles não
sentem remorso dificilmente procuram ajuda, e seu comportamento não é
modificado com punições.
O cinema,
ao longo da história, retratou diversos psicopatas, como Hannibal Lecter no
filme “O Silêncio dos Inocentes”, Jean-Baptiste Grenouille em “Perfume, A
História de um Assassino”, Coringa em
“Batman – Cavaleiro das trevas” Figuras
famosas na história também são consideradas Psicopatas como o imperador
Calígula, e os ditadores Adolf Hitler e Saddan Hussein.
Nem todos
os psicopatas são assassinos, assim como nem todos os assassinos são
psicopatas. Em maior ou menor grau eles podem estar em todas as partes. Indivíduos manipuladores, irresponsáveis,
fingidores e, acima de tudo, frios.
Para
melhor compreensão da patologia recomendo o filme “Precisamos Falar Sobre o
Kevin” de Lynne Ramsay, lançado em 2012.
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