Raquel Rocha
Economista, Comunicóloga, Psicanalista e Especialista em Saúde Mental
Membro da Academia de Letras de Itabuna
Imagem: Katie m. Berggren |
Lembro da minha mãe
fazendo sanduiche para a gente. Ela tinha um ritual que na época eu não
entendia muito bem. Ficávamos todas em volta da mesa esperando cada uma o seu. Então
ela partia o pão no meio, colocava as coisas dentro, fechava o pão, dava uma
mordida e entregava para a primeira filha. Depois ela repetia o mesmo processo: preparava sanduiche, dava outra mordida e entregava para a segunda. Quando ela
entregava o da terceira filha, a primeira pedia outro e pão e ela recomeçava
todo o ritual.
Passados os anos,
refletindo com sabedoria e saudade, achei que entendi o motivo das suas
mordidas: Ela não tinha tempo de preparar o sanduiche dela então ela ia comendo
enquanto preparava o nosso. Minha teoria se confirmava no fato de que no final,
raramente ela comia, porque já tinha se alimentado das mordidas nos repetidos
pães que preparava para a gente. Sanduiche caprichado, um simples pão com
manteiga, as vezes uma tapioca... Não
importava, ela sempre repetia seu estranho ritual da mordida.
Eu também preparo
sanduiche para minhas filhas. Normalmente para uma de cada vez. Não tem fila em
volta da mesa, elas gostam de coisas diferentes, comem em horários diferentes.
Então preparo só dois sanduiches, o da filha em questão e o meu. O engraçado é
que quando percebo, assim como minha mãe fazia, já mordi o sanduiche delas
antes de entregar. Não é racional, não
tem função de me alimentar, afinal é só uma mordida, e eu vou preparar o meu
logo em seguida. Mas quando percebo, já mordi.
Passaram-se mais anos.
Refletindo agora, com mais sabedoria e mais saudade, acho que entendo o verdadeiro
sentido do ritual dela. Não era se alimentar, era compartilhar... Compartilhar
o pão e se alimentar de todo amor que foi colocado nele.
Espero que minhas filhas
um dia também mordam o pão antes de entregar para as filhas delas.
Obrigada mãe,
Eu te amo.
Lindo texto.
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